Passado o susto e o aprendizado da pandemia de Covid-19, a casa e, consequentemente, o conceito de morar com qualidade ganharam novos significados. Para muitos, o lar deixou de ser apenas um porto seguro e refúgio, tornando-se também um espaço onde desejamos receber melhor do que antes, descansar, encontrar leveza e ter tempo para desfrutar tudo isso. Encher os ambientes com um ou outro vaso já não é suficiente – quem se tornou mãe ou pai de planta só se satisfaz com muito verde.
A CASACOR São Paulo 2024, responsável por destacar as principais tendências do universo do morar, movimentou o Conjunto Nacional, em São Paulo, há poucos meses, apresentando mais de 70 ambientes. Sob o tema “De Presente, o Agora”, a mostra propôs uma valorização da ancestralidade e uma reflexão sobre o impacto das nossas escolhas. Na arquitetura, o resgate de técnicas construtivas dos nossos antepassados, como a taipa de pilão, reflete uma busca por soluções mais sustentáveis e amigas do meio ambiente, causando menos danos à natureza.
Esse resgate das sabedorias antigas se estende também aos elementos da casa, como as cestarias e bancos indígenas, além de símbolos das culturas africanas. Podemos dizer que os símbolos dessas culturas, que ficaram ocultos durante muitos anos devido ao preconceito, hoje ganham uma nova perspectiva. Há, atualmente, uma afirmação dessas culturas que foram silenciadas ao longo dos séculos, tanto no Brasil quanto no mundo todo.
Mesmo em um edifício mais fechado, como o Conjunto Nacional, os jardins sempre se destacaram, transformando a mostra em um verdadeiro refúgio de bem-estar, convidando as pessoas a se desconectarem e respirarem ar puro. Vamos apresentar um pouco dos sete jardins da CASACOR São Paulo 2024 que, no ano de 2025, vai ocupar o Parque da Água Branca, símbolo da capital paulista.
Na entrada da mostra, agraciada por um espaço aberto, Mônica Costa realizou um jardim que
homenageia a região do Xingu | Foto: Keniche Santos (Divulgação)
A CASACOR recepciona seus visitantes com a visão magnífica do jardim de contemplação, de 265 m², assinado pela arquiteta e paisagista Mônica Costa. Intitulado Caminhos do Xingu, o projeto surge como um lembrete vívido da importância de valorizar o momento presente e agir com responsabilidade em relação ao planeta e às gerações futuras. A proposta, que se alinha ao tema da edição ‘De Presente, o Agora’, é construída por meio de profundas reflexões sobre a região do Xingu, marcada pelos biomas do Cerrado e da Amazônia. Em um mundo em constante movimento, onde o ritmo frenético muitas vezes distancia as pessoas da essência da vida, o jardim é composto por uma vasta vegetação de plantas tropicais em torno de uma ponte de madeira cumaru, que encaminha o público ao interior do histórico edifício do Conjunto Nacional, onde acontece a mostra.
Pátio Brasileiro é a criação de Gabi Pileggi e Luciana Bacheschi na CASACOR São Paulo 2024 | Foto: Camila Santos (Divulgação CASACOR)
Pela segunda vez na mostra, Luciana Bacheschi e Gabi Pileggi apresentaram o Pátio Brasileiro, um espaço verde repleto de referências históricas e flora nacional. As paisagistas homenagearam a história e a cultura do paisagismo brasileiro, apresentando uma interpretação moderna dos pátios coloniais do Brasil. Elementos como o claustro, a iluminação natural e uma fonte resgatam a essência e a paz dos antigos pátios coloniais, que eram refúgios seguros em meio ao desconhecido. Elas questionam: por que não voltar a ter pátios dentro das edificações nos dias de hoje? A dupla valorizou materiais artesanais de design brasileiro, juntamente com plantas nativas, convidando os visitantes a redescobrir a beleza do paisagismo brasileiro.
Bia Abreu assina o Jardim O Tom do Amanhã, na CASACOR São Paulo | Foto: MCA Estudio (Divulgação CASACOR São Paulo)
Em uma era de automação de processos, a paisagista Bia Abreu estimulou a reflexão sobre as relações humanas ao desenhar um espaço que valoriza o trabalho manual. Seus jardins celebram o esforço humano e o poder da transformação, cercados por espécies do Cerrado e outras plantas tropicais – como acácia-pompom, jasmim-manga, lavandas e capins – que contribuem para o efeito visual e olfativo do ambiente. O espelho escultural de Thomas Graeff ampliou a percepção do espaço de 50 m², com bancos estrategicamente dispostos para permitir uma contemplação prolongada.
Thiago Borges é autor do Jardim dos Quatro Elementos | Foto: MCA Estudio (Divulgação CASACOR São Paulo)
O extenso jardim de 250 m², assinado por Thiago Borges e vencedor do Prêmio promovido pela Veja São Paulo, harmonizou água, fogo, terra e ar. Três espelhos d’água com cascatas evocam a sonoridade das corredeiras, enquanto cinco lareiras trazem o calor das chamas. A vegetação incluiu tamareiras, combinadas com uma ampla cobertura artesanal feita de bambu – um material leve e renovável que contribuiu para a sustentabilidade do projeto.
Jardim Funcional Peugeot, por Gil Fialho | Foto: MCA Estudio (Divulgação CASACOR São Paulo)
O projeto de Gil Fialho para a CASACOR São Paulo foi desenvolvido com o objetivo de trazer biodiversidade ao meio urbano. Através de um jardim que oferece abrigo, frutos e néctar para a avifauna e agentes polinizadores, o projeto promove o aumento das espécies que ocorrem no entorno. A ideia é provocar o visitante a refletir sobre como é possível, mesmo em uma laje urbana, criar um microecossistema onde borboletas, beija-flores e outros pássaros se sintam bem, encorajados a visitar esse espaço verde em meio a uma área urbana rodeada de prédios. Gil explorou ao máximo a área verde do projeto para permitir que o visitante ‘passe’ pelo jardim sentindo o frescor causado pela presença de uma densa massa vegetal que remete às matas tropicais.
A paisagista Renata Guastelli criou ambienteConexão Natural, na CASACOR São Paulo 2024 | Foto: MCA Estudio (Divulgação CASACOR São Paulo)
No espaço Conexão Natural, Renata Guastelli buscou valorizar a integração com a natureza por meio da seleção de plantas que criam um ambiente tropical diversificado, acolhedor e vibrante. O maior desafio foi criar um ambiente com seis entradas diferentes, cada uma conectando-se a um espaço distinto, unificados visualmente através do uso de cores, materiais e texturas consistentes.
O projeto ajudou a promover uma conexão emocional dos visitantes com a natureza e consigo mesmos, distante do materialismo. Utilizando o essencialismo como conceito-chave, o espaço encoraja a introspecção e o contato direto com elementos naturais. O jardim integra os visitantes em um cenário tranquilo, rico em plantas vivas e elementos naturais, proporcionando uma experiência de serenidade e conexão. A sustentabilidade foi um aspecto central de Conexão Natural, manifestada na escolha de materiais e práticas, como o piso drenante monolítico, composto de microseixos de quartzo rolado e aglutinado por uma resina de poliuretano de base vegetal.
Luciano Zanardo criou a Praça Tekohá | Foto: MCA Estudio (Divulgação CASACOR São Paulo)
Inspirado pela filosofia guarani que vê a terra como um lugar de vida e convivência com todos os seres, Luciano Zanardo deu vida à Praça Tekohá. O termo Tekohá, em guarani, significa “o lugar onde somos o que somos”, capturando a essência da integração humana com a natureza, fundamental na cosmovisão indígena. A Praça Tekohá ofereceu uma experiência imersiva e sensorial, destacada pela iluminação da lighting designer e arquiteta Alice Izumi, em parceria com a Natilux, que ressaltou o paisagismo em vasos, plantas e mobiliário. A grande obra “O Tronco”, do fotógrafo Marcelo Menezes, foi posicionada estrategicamente na parede do hall, completando o ambiente.